terça-feira, 2 de agosto de 2011

A palavra 'arte'




A palavra arte descende imediatamente do latim, ‘ars’.

A palavra ars descende, através de tradução do grego: téchne

A palavra téchne significa: habilidade, astúcia no fazer, técnica.


A palavra ars não pode significar "arte" como a entendemos hoje, coisa que a expressão ars mechanica já fazia sublinhar. Ars significa técnica, assim como a entendemos hoje.


[Medicina, engenharia, arquitetura]

(arte = téchne) Saber como fazer.



A não coincidência, para nós, dos termos técnica e arte, se deve em grande parte ao exame da obra Aristotélica, e a uma pequena confusão com o latim.


Aristóteles empreende uma obra a respeito da arte poética, ou em seu origina: poiêtikê technê. Esta se constitui como uma exposição da téchne (saber fazer) da poiesis, sendo o sujeito a poética e não a técnica. Esta ordem é decisiva. Se Aristóteles tivesse tratado os gêneros ‘imitativos’ enquanto episódios de uma téchne, e não de uma poiesis, arte, ars e techné, a poiesis seria mais facilmente considerada um derivado desses.


O termo latino ars tem hoje o seu representante na técnica e na tecno-ciência. O termo ao qual nosso uso da palavra "arte" parece corresponder aos dias atuais, portanto, só pode ser poiesis. Nisso o romantismo parecia insistentemente correto, artistas fazem poesia.


A palavra poesia descende imediatamente do grego, poien/poiesis.

A palavra poiesis significa: realização, criação, poesia (poética).

A palavra poiesis englobava uma série de atividades, em geral voltadas ao manuseio.


[Artesão, escultor, pintor, ceramista]

(arte = poiesis)  Fazer surgir.



A palavra grega mousa significa: música, poema.

Mousa significa hoje uma conjunção de atividades a que atualmente só possuímos o correspondente da ‘canção.’

As musas se confundem em suas habilidades, são todas musicistas e poetisas, ou dançarinas. Temos um panteão com três atividades, que são hoje três atividades "musicais" que reconhecemos hoje como artísticas apenas em sentido geral. Faz parte da arte as belas artes da pintura e escultura, também o teatro. Aqueles que um dia glorificaram a vitória de Zeus foram excluídos e de músicos se transformaram também em poetas e dançarinos.


[Rapsodos, bardos, seresteiros, ditirambo, atores, dançarinos, instrumentistas]

(arte = musa) O surgido, inspirado e de tudo refletido.




O que podemos concluir é que não será a partir da grécia, da pré-história, ou de qualquer outro lugar que iremos conseguir significar o que hoje fazemos e nomeamos enquanto arte. 

As artes, individualmente, possuem origens diversas, raízes que muitas vezes não se comunicam. A comunicação entre elas pode ser estimulada ou evitada, como no conceito de 'belas artes'.

As letras também deixam de ser arte

O romantismo encarnou em si a crise da definição. Sua reação foi retomar a poesia/poética como impulso metafísico primordial e unificador absoluto. Impulso unificador típico do ocidente cristão por um lado, tentativa de valorização filosófica e racional da criação e da liberdade individual por outro. Mas a cristandade romântica com o ideal de valorização da moral a partir do espiritual fez da hierarquia o lugar comum da poesia. Porém, no auge do momento de unificação um momento de atomização imprevisto rouba a cena: a autonomia. Retornamos ao começo, e a origem das artes, como nosso exame grego demonstrou, pouco tem em comum umas com as outras.


Assim se daria também com o andróide, idêntico ao humano em vários sentidos, mas em um sentido muito diverso.

Temos que encarar o fato de que Leonardo da Vinci não fazia arte, mas outra coisa que não era para nossos olhos. A história da arte cuida desses assuntos, de o que chamamos de arte ter no máximo 250 anos.

Mas nos interessamos em cuidar ainda de outro problema. Do fato de nenhuma arte ter qualquer relação com outra arte, em sentido atômico agora, de um grego chamado Demócrito desta vez.

Certa indefinição grega das atividades artísticas era bem vinda porque interessava certo mistério ali no tecido social.

A autonomia vem em sentido contrário. Ela busca distinções com um espírito muito próximo da acuidade científica, conscientes e claras a ponto de extrairmos dela seu máximo sentido, alopaticamente. 

Monta-se assim uma taxionomia própria de cada arte, uma história particular, ramificada, que se encontra no presente com outra diversidade de espécies.  

Enquanto houver um fio condutor que trace a envergadura de uma arte específica desde uma antiguidade qualquer até o presente, haverá ainda uma e mesma palavra a lhe identificar. Mas não deixemos que a mesma palavra iluda.

Tal rito de linguagem, de fixação de termos, sempre pede um sacrifício. Sacrifiquemos então. Diremos agora da música, escultura, teatro, etc., em troca sacrificamos o termo ‘arte’.

Falemos de música, poesia, cinema. E não tratei de nada a não ser de um elogio a Eduard Hanslick ou talves Diderot.

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