segunda-feira, 20 de junho de 2011

Decupagem, Nidação.


Na comunicação escrita. Não é bem visto o escritor que estipula, que dá o tom. Que interfira em qualquer prática ou hábito que é comum. Ao leitor. Mesmo anônimo, não se estipula andamento, não se põe em sua boca nosso ritmo. Não se deve explicar-lhe que em determinada passagem um ou outro afeto deva se destacar, tudo isso a que os músicos se acostumaram não é admitido pelo leitor.  

Nossa recomendação de lentidão certamente se tornará um enfadonho comando, impossível, um impertinente começo e um receito de prematuro fim. Porém, ao mesmo tempo há também uma filosofia, forte, inaudita e antiga, e também uma poeira qualquer. Um único caso. Onde verdade e filosofia podem conjurar.

Isso tudo foi uma frase de Aristóteles. Frase proferida contra a teoria de seu mestre. Sozinha, significou o fim da metafísica, mas porque inaudita, não marcou o fim da filosofia.


METAFISICA, Livro I - IX


"...julgando explicar a substância dos mesmos [sensíveis] admitimos, na realidade, a existência de outras substâncias. Mas como estas [substâncias], sejam as substâncias daquelas, explicamo-lo com palavras vãs, porque 'participar', como mais acima dissemos, nada significa."


Nossa total dedicação. Alguns censuram a voracidade autóptica, tão estranha aos gregos. Mas foi este o tom, o mesmo com que ainda hoje a modernidade desencanta, a procura por substâncias não duplicadas. Difícil e complicado de as encontrar.

A filosofia viu a morte do estagirita, e mostrou-se pouco interessada na tarefa, pois vende-se mais livros se significamos ainda mais o mito, e o mito da própria filosofia. Afastado disso tudo, a escrita Aristotélica inscrevia inaudita uma linguagem. Aristóteles estava, ao abandonar Platão, abandonado o pensamento analógico, e introduzindo o digital - a imagem do próprio pensamento não pode se igualar às imagens que o pensamento mesmo cria.

" a imagem do próprio pensamento não pode se igualar às imagens que o pensamento mesmo cria."

Um recado discreto em uma pequena sentença de uma filosofia antiga. Seguir o recado seria como se engajar em algo que viria a se chamar filosofia, mas que não se cumpria. Evitar justamente o que a filosofia que evita a metafísica se torna, uma inquirição metafísica.


                                                                        [- o processo mitose]


A meiose é o processo de divisão celular que consiste em produzir uma duplicação, da célula, carregando metades aleatórias das células que lhe deram origem. O ciclo metafísico em seus altos e baixos pareceu finalmente que teria fim com o empirismo, por mera sorte de um crossover. E novamente com a filosofia transcendental. E novamente com a fenomenologia. Mas o idealismo e a ontologia, por herança de genes ancestrais mantém o ciclo metafísico desperto. O material não se esgota, surge sempre em ciclos distribuídos ao sabor dos tempos.


A meiose não pode evitar o retorno do ancestral. E como podem observar falamos aqui de nascimento.


Dos Pais da Filosofia:

Ambos despatriados. A mãe renegada. O pai, sempre um rei próximo a morte que esforça-se ainda a encontrar "alguma coisa" antes que o filho venha.

O Pai descarta o feminino e a terra para sua descoberta é toda abstrata, e sua inseminação,
seu seminário, inicia por proclamar a filosofia toda sua.
    


METAFISICA, Livro I - II


"O mesmo sucede com o macho em relação à fêmea; esta é fecundada com uma única cópula, mas o macho fecunda várias fêmeas."

[Comentário ao modo como as Idéias de Platão participam das 'coisas']



O que fazia então a filosofia medieval, a filosofia idealista, a ontologia, senão tentar encontrar "alguma coisa" que mostrasse prova deste carimbo papal, do garanhão da forma universal, da própria concepção divina?

A filosofia parece querer encontrar "alguma coisa". Mas quem iria querer encontrar "alguma coisa" em uma teoria?

Duplicar idéias, e não se dedicar à agronomia de ver crescer, das condições do tempo, dos detalhes e distinções. 

Se pessoas sãs acreditassem no "ser das coisas" fumariam ópio a encontrá-las. E o que fazia Heidegger senão querer encontrar uma pedrinha escura e brilhante no interior do pensamento? A filosofia paterna se vê obrigada a postular objetos inalcansáveis os mais absurdos e vistosos que Deus. Ao fim, haviam desistido do mundo, e deram voz às palavras, deram voz a tudo que deveria correr inaudível.



METAFISICA, Livro I - IX



"Em geral, procurar os elementos dos seres sem os distinguir, apesar de serem múltiplas suas acepções, é impossibilitar-se de os encontrar, sobretudo se, desta forma, investigarmos de que [elementos] são constituídos"



Chegou muito tarde aquele filósofo que temia a fala do que não podemos falar, e temos que admitir isto: filósofos, não busquem duplicar o verbo do mundo pela teoria! Eles não sabem o que fazem e duplicam e dobram o mundo e a teoria faz escapar para o fundo, para a dobra, para o reverso, aquela pedrinha brilhante e escura, mas ela está lá, dizem, chacoalham seu papelão e afirmam estar nas desdobras o caminho.

A arte do falsário é prometer, do prestidigitador é camuflar. Tudo não passou de um truque, não chegam a 1001 noites e a água escorre novamente: quem mais vai querer fecundar as palavras?

 Um pouco antes, e com prudência, soemos o alarme...

         - A filosofia não tem objeto. Esta é a última distinção.

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